Com quantas incertezas faz-se uma vida? São muitas, dizes-me, e concordo com a cabeça e um olhar para longe. O fumo do cigarro espalha-se, leve, adaptável, sem importância, tão diferente de nós, e no entanto prende os nossos olhos, é a nossa desculpa para não ver o mundo que há por detrás e que depressa revela-se porque o que fascina, fascina por pouco tempo. A beleza é um instante, como tudo que é eterno e foge ao tempo, como tudo que nos marca no mais fundo de nós, no lugar esquecido do eu, pois é preciso viver e viver só é possível com os outros. Por isso, é bom que estejas aqui a partilhar comigo o teu silêncio. Eu tenho tanto. Custa-me guardá-lo todo para mim. E assim, o meu e o teu, juntos, fazem um silêncio novo e suportável. Somos todos sós, minha querida. Há um limite intransponível, a nossa pele. O que há por debaixo? Encontras-me? Tu também não estás sob a tua. Onde estamos? Dizemos aqui dentro, mas aqui dentro é uma ilusão. É apenas carne e sangue, metáforas vulgares que usamos para o animal e o deus que inventamos em nós. Não me procures aí. Eu já te fui procurar no mesmo sítio e não encontrei o todo que és. O que vi foi apenas um adorno da tua totalidade, a tua imagem. Eu quero o que dá sentido ao teu nome. E ao meu. Esse intangível que somos e que manifestamos agora, inesperadamente, enquanto misturávamos silêncios e criávamos, a dois dedos, figuras irreconhecíveis no fumo de um cigarro partilhado.
terça-feira, 15 de maio de 2012
No fumo de um cigarro partilhado
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