segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Desentender o mais possível

Farruco, estás a ouvir? Não. Eu já imaginava. Sou um pouco outro desde que deixei de viver ao pé de ti. Vejo-te agora só de tempos em tempos, meu amigo. E já acumulei tanta coisa miúda. Juntas parecem figura impossível e não sei se dá para pôr em dia se às tentasse desenformar numa conversa. A tua rotina eu ainda sei. Não deve ter mudado grande coisa. Mas há sempre novidade dentro do que por fora parece repetitivo. No essencial do viver. Como a flor que é sempre flor e nunca a mesma. E por nunca ser a mesma é que ela é. Não entendeste. Eu sei. Esquece. Para quê? Vou seguir o conselho dos teus olhos: é preciso tentar desentender o mais possível. Não abras assim a boca a despejar em mim esse imenso bocejo. Sim sim eu me apresso, sei que vais dormir na tua cama junto às brasas que estão a crepitar na lareira mas já se vão apagar. Eu vim ao sítio da imaginação para te dizer uma coisa, cãozinho: dorme, mas não te esqueças: estou de longe a velar o teu sono. Não só pelo que és, mas também pelo que eu sou se atravesso um pouco da minha humanidade por ti. Dorme. Amanhã acordamos a nossa linguagem comum. Onde nos vamos encontrar? entre os dois vasos de orquídeas do nosso costume. Aposto contigo: vão estar cobertas de orvalho. E vou molhar as pontas dos dedos na manhã.

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