terça-feira, 29 de abril de 2014

A brisa verde

Sempre por esta hora, uma brisa atravessa a aldeia e vem dar à varanda. Se tivesse cor seria verde. Tem cheiro de eucaliptos, pinheiros, capim. Sento-me no topo das escadarias e espero. Olhos fechados, nariz atento, pele passiva. Quem me dera ser minúsculo e poder sair de mim mesmo para ouvir o seu farfalhar nos pelos do meu braço esquerdo, que é por onde a brisa me chega primeiro. Ponho-me de pé num salto e olho para o céu estrelado: não sou grande... Do alto do azul-negro quem me poderia ver, ainda que a toda força dos olhos? O meu tamanho seria o da não existência. No mínimo um diminuto espaço vazio, sem passado. Ponho-me de volta no meu lugar, sento-me. Para ser no meu pouco. O meu lugar é o da natureza imediata, que não dá nomes a si mesma e no entanto revela-se no nome de todas as coisas. Como neste: brisa. Nome soprado. Que sobe pelo meu braço e senta-se em meu ombro. (som de mar em concha no meu ouvido esquerdo) Cala-te! — pareceu-me ouvir em duas ondas secas. Vou atendê-la. Pelo sim, pelo não. Calei-me. Nem foi preciso muito tempo. Mas só então pude ouvir algumas coisas que não sei dizer. As mais importantes, até agora.

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