Oi, Farruco. Tudo bem? Faz tempo que não conversamos. Também já foi feito algum passado com o tempo em que não vamos à varanda fumar um cigarro seguido das festas na tua cabeça e do teu automático capotamento para as cócegas de costume. Tão tolinho. Sempre ris com as patas traseiras em abano, como se fosse novidade e tivesse mesmo alguma graça. É por sermos amigos, eu sei. Lembrei-me de ti, da tua amizade e fidelidade, da tua paciência, dessa tua ausência de maldade humana e da tua memória curta e com apagamento instantâneo para a nossa impaciência. Na minha cabeça não há confusão de espécies, e tu sabes disso que eu já to disse. És um cão, eu sou um homem. Mas é justo por isso, por seres um animalzinho, que eu te posso interpretar e entender com o empréstimo da minha humanidade — o que te cai tão bem por seres inteligente. A ingenuidade é um atributo dos animais. Nos homens fica mal, além de gerar certa suspeita por ser do nosso destino transcender o animal que temos em nós. É um falhanço geral, mas a tentativa da transcendência já nos dignifica a um mínimo possível. Cumpres-te a ti e à tua espécie sendo um animal em perfeição, mesmo quando não o pareces ser por demonstrares mais. Mas nós, seres humanos, não temos hipótese viável: ou somos homens ou bestas. O meio-termo é a degradação de um destino. Mas vou pôr termo à nossa cavaqueira que já são horas e isto de tratar assim a nossa amizade é já coisa do homem que sou. Se fosses tu a puxar conversa era um latido de alegria, pinotes e deslizes de contentamento no ladrilho da varanda e eu a dizer está quieto, seu maluco!, mas com um sorriso de vaidade e um desviar de olhos a explicar para quem estivesse perto «Este cão não é normal», mesmo sabendo que isto sim é que é.
quinta-feira, 14 de junho de 2012
Conversa com Farruco
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