sábado, 29 de junho de 2013

Aparição pagã

dfdffdAcendo o cigarro. Não há mais ninguém sentado na esplanada do café. Vejo então uma mulher a se aproximar trazendo pela mão uma criança. Veste-se como noiva, mas sem véu e grinalda. Um vestido de renda, bege claríssimo, forro acetinado. O sol, por detrás dela, incandescente, desfoca-me a vista causando um efeito de aparição. Uma deusa pagã. Não pode ser. A esta hora da tarde? O menino veste branco e listras vermelhas. Ela traz os seus cabelos louros presos. Flutua pela esplanada na direção do café. Passa ao meu lado, os olhos sempre para frente. Ouço um boa tarde mas não percebo qualquer movimento nos seus lábios. O menino fita-me, tudo nele são olhos. Estou a ver coisas, penso. Eles entram no café. Apago o cigarro e entro logo atrás. Vejo-a ao balcão a pedir algo, mas não consigo ouvir a sua voz. Ainda uma aparição, mas já mais para o humano. Aproximo-me. Os meus olhos acostumam-se com a claridade menos intensa do interior do café. É uma mulher. Era o sol. O sol incandescente por detrás daquele vestido. Como nas fotografias, a luz é tudo. O resto são sombras. E na sombra a divindade constrange-se. Oculta-se. Virei o rosto em outra direção. Fingi esquecê-la para que ela se fosse. Não vi quando ela saiu do café. Se saiu. Ou se desapareceu de volta na luz do sol deixando para trás estas sombras. Onde estou.

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