Maus pensamentos

No que estás a pensar, Lila? Há todo um passado nestas entrelinhas, mas insisto em mentir quando digo que não sei no que pensas. Eu sei. No impensável de nós. Essa massa informe de recordações gestos palavras, o nosso convívio esparso e que agora é um amontoado de palavras que tenta transitar dos meus para os teus olhos. Eu sei. Mas é melhor não saber. Faz o mesmo aí no teu impossível. Penso na dissolução da tua vida presente com a expectativa de um futuro improvável baseado num passado que não foi mas que viria a ser se o inventássemos órfão da realidade e do tempo. Maus pensamentos, eu não concordo contigo mas digo que sim para não haver destino. Não agora. E no entanto concordamos que o que eu penso seria bom para nós dois. E só. E tanto. Por isso, eu vou insistir na pergunta fingida que tenho na mão e que sempre lanço ao alto quando passas: no que estás a pensar, Lila? Mas a minha pergunta cai com estrondo no chão e um solavanco parte em dois o nosso mútuo encantamento. Então sorrimos sem jeito um para o outro. E acenamos adeus, mesmo sabendo que entre nós não há meio de o acenar sem fingimento.