segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Segredo arranjado

Há roupa pelo chão desde a sala até o quarto, mas ainda é cedo. Não acordes. O dia amanhecerá em breve e o quotidiano entrará pela janela montado num raio de sol: uma lâmina de luz a riscar a penumbra onde estamos. Não quero abrir os estores. Quero ser estúpido: tentar atrasar a realidade, desistir do tempo, esquecer dos outros. Nós. E tanto ainda por. Espera. Olho subitamente para o teu corpo através das ondas do lençol, este nosso mar lilás, e encontro um vestígio do nosso segredo arranjado. Ficou em ti. Desprezamos tudo o que houvesse para além do cansaço, eu sei. E ainda dormes. Tão suave. Raios de sol, mar de ver e areia em curvas, a tua descrição. Eu prometo que vou empurrar o dia com toda a força para além dos estores. Que fique lá. Depois, quando os teus olhos, inevitáveis faróis, acenderem mais uma vez, hei de trazer outras ondas de tempestade. Ritmo do mar nas pedras. Para todo o resto, um grito: esqueçam-nos! não existimos acima deste nosso mar lilás. Já naufragamos tantas vezes. Mas nunca o bastante. O futuro? O futuro é invenção.

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