O sol quase a partir os vidros dos olhos, o rosto enrugado de ambos, o encontro na beira da estrada, a respiração abafada diminuindo aos poucos, um de frente para o outro. Após breves adaptações de foco, ela pergunta:
— Aonde vais?
Então ela passa a piscar mais depressa, a mão a fazer de toldo sobre as sobrancelhas. Não há ajuste de foco que nos chegue, não sob este sol metálico e invisível apesar de presente em todo lado ou justo por isso. Digo-lhe não sei, não faço ideia, ia para o lugar de sempre apesar de não. É lá e não é, como hei de explicar-te?
— Explica-me. Se me convenceres vou contigo.
Como explicar? se não sei. Vou para onde me é possível. Onde há o meu mínimo e ainda assim insuficiente. No entanto, tanto fazia se eu não fosse. Mas se eu ficasse, fosse onde fosse, seria para mim o lugar do insuportável. Que é qualquer um, esteja onde eu estiver. Esteja quem estiver. Não sei.
— Perdeste-te dentro de ti, estou a ver. Dá-me a tua mão e vem comigo.
— Para onde?
— Não te preocupes. Eu sei para onde. Sei sim, acredita, mas só se eu for contigo. Sozinha, eu ia para o mesmo nenhum lugar que tu.
— O que vamos fazer?
— Sair de dentro de nós, de um para o outro. Existir um pouco.
Perguntei e depois? Ela sorriu. Uma gota de suor escorreu pelo seu rosto branco, que ali, naquela linha, tornava-se ainda mais branco, de um brilho invulgar. Vi o reflexo do sol naquela gota e era como se ele se fosse pôr nos seus lábios. O pôr do sol na tua boca — pensei. Abismo. Viria a noite, então, depois?
— E depois? ora essa, depois será noite. Fechamos os olhos. Será tempo para não existir. Ou de fingir qualquer coisa assim, não penses. Deixa as mãos livres para a invenção. Nunca sonhaste?
— Sonhei. Mas não é hora. Vou contigo.
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